As divergências quanto à forma de cumprimento ou, até mesmo, resolução dos contratos durante a pandemia do COVID19 têm sido frequentes e, por vezes, geram conflitos entre as partes contratantes. Isso porque, a depender do objeto contratual, a sua devida prestação foi impedida pelas determinações em âmbito nacional de circulação de bens e pessoas, diminuindo, dessa maneira, as opções de cumprimento.
Diante desse cenário, a adoção de métodos de resolução de conflitos de forma extrajudicial surge como possível solução já que, a depender do contexto enfrentado pelos contratantes, as modalidades podem se mostrar mais rápidas, eficazes e econômicas. Portanto, sendo a pandemia considerada como evento de força maior a depender do caso concreto, a opção entre a liberação do devedor sem pagamento de perdas danos ou, ainda, a restauração do equilíbrio contratual[1] pode ser feita sem a interferência do Poder Judiciário.
A urgência da adoção de medidas é reconhecida pelo próprio judiciário que tem buscado medidas de conciliação no contexto da pandemia. Exemplo de tal afirmação é o “projeto-piloto de conciliação e mediação pré-processuais para disputas empresariais decorrentes dos efeitos da covid-19” desenvolvido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, que busca contornar os efeitos da judicialização em massa das disputas envolvendo contratos empresariais e demandas societárias diretamente relacionadas à pandemia[2].
A negociação extrajudicial pode ser conduzida com – e sem – a presença dos advogados das partes, seja por meio da apresentação de propostas e contrapropostas de resolução, seja por meio da construção de um acordo conjunto pelas partes, objetivando-se a melhor opção às partes nos termos da lei.
A mediação, por sua vez, ocorre com a presença de um profissional habilitado e alheio à relação contratual conflituosa, possibilitando a reabertura do canal comunicativo entre as partes e construindo uma opção viável entre as opiniões divergentes[3]. Diversas câmaras de arbitragem oferecem o serviço e, existindo uma decisão final, esta será somente homologada pelo juiz competente. Além disso, tanto a negociação quanto a mediação podem ser realizadas em qualquer momento do conflito, mesmo que este já tenha sido direcionado às vias judiciais ordinárias.
Tem-se, ainda, arbitragem[4]. Diferentemente das demais formas de resolução de conflitos, está é uma forma heterocompositiva de solução de litígios de modo que a decisão final é apontada por um Tribunal Arbitral indicado pelas partes após o devido processo e produção de provas. Para tanto, as partes podem inserir uma cláusula compromissória arbitral ou, ainda, firmar compromisso arbitral após o surgimento do conflito.
Câmaras de arbitragem como a ICC (International Chamber of Commerce) tem alterado suas cláusulas arbitrais e de força maior, além de emitir orientações gerais às partes sobre formas de cumprimento e preservação dos negócios jurídicos mantidos entre elas – seja em momento anterior à pandemia ou, ainda, no novo cenário que enfrentamos[5].
Todos os métodos mencionados podem ser adotados em vias remotas e, por isso, facilitam a comunicação das partes e responsáveis – mediadores, árbitros e advogados. Além disso, câmaras de mediação e arbitragem tem oferecido serviços, protocolos, reuniões e audiências à distância, possibilitando a resolução do conflito mesmo em momentos de isolamento social.
[1] Código Civil: Art. 399. O devedor em mora responde pela impossibilidade da prestação, embora essa impossibilidade resulte de caso fortuito ou de força maior, se estes ocorrerem durante o atraso; salvo se provar isenção de culpa, ou que o dano sobreviria ainda quando a obrigação fosse oportunamente desempenhada.
(…)
Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação.
Art. 479. A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar eqüitativamente as condições do contrato.
Art. 480. Se no contrato as obrigações couberem a apenas uma das partes, poderá ela pleitear que a sua prestação seja reduzida, ou alterado o modo de executá-la, a fim de evitar a onerosidade excessiva.
[2] TJSP: PROVIMENTO CG Nº 11/2020. Processo 2020/42835. Disponível em: https://www.tjsp.jus.br/Download/Portal/Coronavirus/Comunicados/Provimento_CG_N11-2020.pdf. Acesso em: 05/05/2020.
[3] Lei nº 13.140/2015: “Considera-se mediação a atividade técnica exercida por terceiro imparcial sem poder decisório, que, escolhido ou aceito pelas partes, as auxilia e estimula a identificar ou desenvolver soluções consensuais para a controvérsia.”
[4] A arbitragem é um mecanismo privado de solução de litígios, por meio do qual um terceiro, escolhido pelos litigantes, impõe sua decisão, que deverá ser cumprida pelas partes” em CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e Processo: um comentário à lei nº 9.307/1996. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 2009, pp.31-32.
[5] Disponível em: < http://iccbrasil.org/media/uploads/2020/04/30/forca-maior-e-hardship.pdf>. Acesso em 05/05/2020.