Em 27/05/2020, o Pleno do Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou o julgamento de duas ações acerca da possibilidade de decisões judiciais determinarem a indisponibilidade do serviço prestado por aplicativos como “Whatsapp” em todo o país.

A ADIn (Ação Direta de Inconstitucionalidade) nº 527, ajuizada pelo Partido da República, de relatoria da Ministra Rosa Weber, questionou a constitucionalidade dos artigos 10, §2º, e 12, incisos III e IV, do Marco Civil da Internet (Lei n. 12.965/2014).

A Ministra Relatora destacou que a inviolabilidade do sigilo de correspondência, direito fundamental assegurado pelo art. 5º, inciso XII, da CR/88, só pode ser excepcionado pela determinação judicial para fins de investigação criminal ou instrução de processos penais.

Assim, a Ministra Rosa Weber, julgou procedente o pedido de interpretação conforme a Constituição do art. 10, §2º, que dispõe que “O conteúdo das comunicações privadas somente poderá ser disponibilizado mediante ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer”, assentando sua interpretação no sentido de que o conteúdo das comunicações privadas somente poderá ser disponibilizado: i) mediante ordem judicial, respeitados os incisos II e III do art. 7º e ii) para fins de investigação criminal ou de persecução processual penal, conforme interpretação restritiva do art. 5º, XII, da CR/88.

Tratando-se de norma restritiva de direito fundamental da personalidade, sua interpretação deve ser, igualmente, restritiva.

Ainda, julgou parcialmente procedente o pedido de interpretação conforme a Constituição do art. 12, incisos III e IV, para assentar que as penalidades de suspensão temporária das atividades apenas podem ser impostas aos provedores de aplicação de internet nas hipóteses de descumprimento da legislação brasileira referente à coleta, guarda, armazenamento e tratamento de dados, o que não é o caso quando o serviço é criptografado como no aplicativo Whatsapp.

A Ministra destacou em seu voto que as atividades desempenhadas pelo aplicativo Whatsapp são serviços de valor adicionado aos serviços de telecomunicações. Os provedores do aplicativo, assim, são usuários dos serviços de telecomunicações.

Nesse sentido, o questionamento posto é se o Estado pode obrigar os particulares que oferecem plataformas como o Whatsapp de adotarem mecanismos que assegurem o armazenamento do conteúdo de conversas para o caso de, em virtude de determinação judicial, ser imposta a sua disponibilização, devendo sofrer penalidades se não cumprirem a ordem nesse sentido.

A resposta encontrada pela Ministra em seu voto foi negativa. Segundo esclareceu a partir dos amicus curiae do julgamento, o serviço oferecido pelo aplicativo Whatsapp, de comunicação com criptografia de ponta a ponta dos interlocutores, é um serviço cujo conteúdo é inacessível até mesmo ao provedor da plataforma. Dessa forma, o Estado não pode compelir o particular a fornecer serviço menos seguro, sob pena de tornar ilegal a criptografia.

A Ministra também ressaltou que, embora a criptografia seja tão antiga quanto a escrita, o seu desenvolvimento é o que torna as transações atuais mais seguras, tornando, por conseguinte, a sociedade mais segura. Em suas palavras, seria retrocesso limitar o uso da criptografia.

Por fim, asseverou que a violação à privacidade é que é apenada, e não a privacidade em si. Não há nada na lei que ampare ordens de suspensão dos serviços de comunicação como o Whatsapp.

Já a ADPF (Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental) nº 403, ajuizada pelo Partido Cidadania, de relatoria do Ministro Edson Fachinn, teve por objeto decisão que determinou a suspensão dos serviços do aplicativo Whatsapp por 72 horas em todo o território nacional.

O julgamento de ambas as ações prosseguirá em 28/05/2020, oportunidade em que o Ministro Edson Fachin proferirá seu voto relativo à ADPF nº 403 e os ministros se posicionarão a respeito dos feitos.