Regulação do crowdfunding no Brasil – a instrução cvm nº 588/2017

A Instrução nº 588/2017, editada pela Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”), regulou o crowdfunding no Brasil. A modalidade de financiamento coletivo já é consolidada em diversos países, como Estados Unidos, Alemanha e Itália, e ainda carecia de normatização específica no país.

O crowdfunding se caracteriza como uma modalidade de investimento pela qual uma variedade de investidores, muitas vezes de pequeno porte, pode investir certas quantias de dinheiro em determinado negócio ou projeto.

Os investimentos se dão por meio de plataformas eletrônicas especializadas, responsáveis por realizar a oferta e conectar potenciais investidores a projetos em busca de financiamento. A plataforma mais conhecida é a norte-americana Kickstarter (“Chute Inicial”, em tradução livre), focada em angariar investimentos para projetos criativos. A empresa já movimentou mais de 3,2 bilhões de dólares, financiando mais de 129 mil projetos. No Brasil, algumas plataformas já ganham espaço no mercado, como são os casos da Catarse, Vakinha e Benfeitoria. No entanto, a modalidade de investimento encontrou várias dificuldades no mercado brasileiro, muito em função da desconfiança dos investidores. Nesse contexto, a Instrução CVM º 588/2017 é muito bem-vinda, tendo em vista que trouxe uma regulação específica para a matéria e, consequentemente, mais segurança para aqueles que desejam se aventurar nos financiamentos coletivos.

A referida instrução, em seu artigo 2º, definiu crowdfunding como a “captação de recursos por meio de oferta pública de distribuiçãode valores mobiliários dispensada de registro, realizada por emissores considerados sociedadesempresárias de pequeno porte nos termos desta Instrução, e distribuída exclusivamente por meio deplataforma eletrônica de investimento participativo, sendo os destinatários da oferta uma pluralidade de investidores que fornecem financiamento nos limites previstos nesta Instrução”.

As sociedades empresárias de pequeno porte, de acordo com a Instrução CVM 588/2017, são aquelas constituídas e registradas no Brasil, com receita bruta anual não superior a R$10.000.000,00 (dez milhões de reais) apurada no exercício social anterior à oferta e que não seja registrada como emissor de valores mobiliários na CVM.

A captação de recursos pelas sociedades de pequeno porte por meio de crowdfunding deve se limitar a R$5.000.000,00 (cinco milhões de reais) e com prazo de oferta não superior a 180 (cento e oitenta) dias, sendo conferidos aos investidores, ainda, prazo de 7 (sete) dias para desistirem daoperação.

Os investimentos podem ser feitos por meio de Sindicatos de Investimento Participativo, que, nos termos da mencionada Instrução CVM, são grupos de investidores vinculados a um investidor líder e reunido com a finalidade de realizar investimentos em sociedades empresárias de pequeno porte. O investidor líder, por sua vez, é uma pessoa natural ou jurídica com comprovada experiência em investimentos.

A captação de recursos, via de regra, é limitada a R$10.000,00 (dez mil reais) por investidor.As exceções são os casos de investidor líder, definido acima, do investidor qualificado, definido pela Instrução CVM 554/2014, ou de investidor cuja renda bruta anual ou montante de investimentos financeiros seja superior a R$100.000,00 (cem mil reais).Neste último caso, o limite pode ser ampliado em até 10% do maior destes dois valores.

Não será considerada como oferta pública de valores mobiliários o financiamento captado quando o retorno do capital recebido se der por meio de brindes, recompensas, bens ou serviços, podendo a CVM suspender ou cancelar, a qualquer tempo, a oferta de distribuição que se processar em condições diversas daquelas constantes da Instrução CVM 588/2017 ou qualquer outra norma editada pela CVM.

Vale ressaltar que os recursos captados não podem ser utilizados pela sociedade emissora dos valores mobiliários para fins de operações societárias de fusão, incorporação, incorporação de ações e aquisição de participações, aquisição de títulos e valores mobiliários de emissão de outras sociedades ou concessão de crédito a outras sociedades.

As ofertas públicas de distribuição de valores mobiliários são feitas privativamente pelas plataformas eletrônicas de investimento participativo, que, por sua vez, são definidas pela Instrução como pessoas jurídicas regularmente constituídas no Brasil e registradas na CVM com autorização para exercer profissionalmente a atividade de distribuição de ofertas públicas de valores mobiliários emitidos por sociedades empresárias de pequeno porte.

Para obter e manter o registro na CVM como plataforma eletrônica de investimento participativo, o requerente deve (i) ser pessoa jurídica regularmente constituída e registrada no Brasil, (ii) possuir capital social integralizado de pelo menos R$100.000,00 (cem mil reais), (iii) dispor de procedimentos e sistemas de tecnologia adequados para efetuar a identificação do investidor, (iv) registrar sua participação e obter e guardar o termo de ciência de risco assinado por ele, (v) operar fóruns eletrônicos de discussão, (vi) divulgar as informações aos investidores exigidas pela Instrução CVM 588/2017, (vii) atender reclamações de investidores e (viii) garantir a segregação dos investimentos captados, de forma que estes não se comuniquem com o patrimônio da plataforma, de seus sócios e administradores, de empresas por ela controladas, do investidor líder e pessoas ligadas a ele e da sociedade empresária de pequeno porte até o encerramento da oferta que alcance o valor alvo mínimo de captação.

No contexto econômico atual, com ascensão de startups e outros projetos de inovação, a regulação do crowdfunding trará efeitos extremamente positivos, proporcionando a estes pequenos empreendedores a captação da poupança popular, sem precisar de registro prévio na CVM e com menor desconfiança por parte dos investidores.

Thomaz Murta e Penna