A Lei Geral de Proteção de Dados (Lei 13.709 de agosto de 2018), começou a ter vigência em 2020, com exceção das sanções previstas no artigo 52, que apenas começaram a vigorar em agosto de 2021. Neste período, as primeiras decisões sobre o tema puderam ser observadas, indicando como será de fato a aplicação da lei.
Primeiramente, cabe expor as estatísticas sobre as decisões, que foram levantadas pelo Centro de Direito, Internet e Sociedade (CEDIS-IDP) do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP) em parceria com o Jusbrasil. A maioria das decisões que abordam a LGPD foram proferidas pelos tribunais estaduais (47,1%), seguidos da justiça trabalhista (que foi responsável por 41,2% das decisões sobre o tema).
Entre os tribunais estaduais, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo foi o órgão que mais proferiu decisões com base na Lei Geral de Proteção de Dados, seguido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Paraná e pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais.
Em relação ao mérito das decisões, observa-se que elas não se aprofundaram nos conceitos previstos na lei, aplicando-a apenas como reforço à outras normas existentes, como o Código de Defesa do Consumidor, as normas do Código de Processo Civil e a própria Constituição.
Foram levadas ao poder judiciário discussões sobre os mais diversos temas, como os limites dos inquéritos policiais, o compartilhamento e o acesso de dados da base do poder público e as fraudes nas relações de consumo. Os assuntos que foram apreciados pelo judiciário e merecem maior destaque são: a produção de provas em processos judiciais a possibilidade da condenação em danos morais em decorrência do vazamento de dados e o sigilo de informações do trabalhador no processo trabalhista.
No que tange à produção de provas no processo judicial, encontram-se casos em que as partes alegam a proteção de dados como alternativa para a não exibição de um documento ou como óbice para análise de arquivos digitais e afins. Nesse caso, observa-se uma unanimidade nas decisões no sentido de que a LGPD não pode obstar a produção de provas judiciais para solução da demanda.
Uma das questões mais relevantes discutidas até o momento é a possibilidade de o titular dos dados pleitear uma indenização por danos morais nos casos em que há vazamento. Nesses casos, o entendimento é unânime no sentido de que é possível que haja a condenação em danos morais. Contudo, os tribunais têm divergido se os danos morais no caso são presumidos, ou seja, não havendo necessidade da produção de provas da ocorrência do dano, ou se o titular deve apresentar aos autos comprovação dos danos causados pelo vazamento.
Por fim, em relação aos processos trabalhistas, a discussão permeia a utilização da LGPD para proteção das informações dos trabalhadores dentro dos processos, tendo em vista que esses dados podem prejudicar os titulares de obterem futuros empregos. Neste sentido, há decisões conflitantes sobre o tema. Parte dos tribunais entende que a LGPD conferiria especial proteção a esses dados, justificando a adoção de medidas como a ocultação do nome das partes e dos dados sensíveis no processo. Por outro lado, algumas decisões defendem que as normas preexistentes são suficientes para conferir tal proteção, não sendo o caso de aplicação da Lei Geral de Proteção de Dados.
Essa discussão é de grande relevância para o cenário brasileiro, tendo em vista que, frente a eventual vazamento de dados, as empresas correm o risco de ter que arcar não só com as sanções previstas na LGPD como também a indenizar todos os titulares dos dados vazados, mesmo que não haja a comprovação da efetiva ocorrência de dano. Portanto, é um dos pontos que deve ser acompanhado para possível definição nos tribunais superiores.
Apesar de já haver inúmeras decisões que abordam a Lei Geral de Proteção de Dados, conclui-se, pela análise do conteúdo delas, que importantes aspectos da lei ainda não foram objeto de apreciação do poder judiciário, como a aplicação de sanções, a definição dos limites dos conceitos, a força normativa das normas editadas pela autoridade de proteção de dados e outros temas de grande relevância para a proteção de dados no Brasil.
Portanto, é necessário aguardar até que esses assuntos sejam objeto de decisões judiciais, uma vez que só assim será possível observar como será a aplicação, na prática, da LGPD, além de definir quais os pontos merecem maior atenção para as empresas e para os titulares dos danos. Confira o inteiro teor da pesquisa no link a seguir: https://www.jusbrasil.com.br/static/pages/lgpd-nos-tribunais.html