O herdeiro do sócio minoritário, que não participou de fraude, não pode ser atingido pela desconsideração da pessoa jurídica

O artigo 50 do Código Civil de 2002 prevê a desconsideração da personalidade jurídica, que consiste na extensão dos efeitos de certas obrigações para atingir o patrimônio particular do sócio. Como a separação do patrimônio da sociedade e dos sócios é um princípio do Direito Empresarial, que visa da maior segurança ao investidor, a desconsideração da personalidade jurídica somente é cabível quando há abuso, caracterizado por desvio de finalidade ou confusão patrimonial.

Nesse contexto, instaurou-se discussão judicial acerca da possibilidade da desconsideração da personalidade jurídica atingir somente o patrimônio dos sócios que praticaram os atos ilegais, ou se se estenderia a todos os demais sócios. O principal argumento dos credores da sociedade é que o artigo 50 do CC/02 não dispõe acerca de limitações da desconsideração da personalidade jurídica, ou seja, a interpretação literal levaria a crer que as dívidas da sociedade, quando desconsiderada, atingiria o patrimônio de todos os sócios.

Contudo, em diversos julgamentos, o STJ tem firmado entendimento de que não é plausível que a desconsideração da personalidade jurídica atinja o patrimônio do sócio que não possui poderes de gerência e administração da sociedade, uma vez que, via de regra, são incapazes de praticar atos fraudulentos. Destaca-se que essa regra não é absoluta, tendo a própria corte admitido a responsabilização desses sócios quando, por exemplo, há clara confusão patrimonial ou quando o sócio age de má fé pela conivência com os atos fraudulentos.

No caso julgado, o falecido acionista minoritário possuía 0,0004% do capital social, não tendo o credor comprovado que ele exerceu qualquer influência nos atos de abuso de personalidade apontados ou mesmo que tinha conhecimento de tais. Com base nesses fundamentos, o TJSP negou o pedido de afetação do patrimônio do herdeiro devido à desconsideração da personalidade jurídica.

 Por sua vez, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Resp. 1.861.306 – SP, manteve a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo, entendendo que o sócio não concorreu para os atos de abuso da personalidade jurídica, não devendo ser responsabilizado pelas obrigações da sociedade. Dessa forma, o herdeiro do sócio minoritário não terá o seu patrimônio afetado. Tal decisão garante maior segurança jurídica aos empresários, uma vez que preserva o princípio da separação patrimonial entre sócios e sociedade, não permitindo que determinado sócio, principalmente quando não detém poderem de gerência e administração, seja responsabilizado por atos fraudulentos que não eram de seu conhecimento.