As empresas fechadas que têm como controlador uma companhia de capital aberto deve seguir as regras da Comissão de Valores Mobiliários sobre divulgação de mudanças em seus estatutos. O entendimento foi aplicado pelo juiz Leonardo Cacau Santos La Bradbury, da 2ª Vara Federal de Florianópolis, ao suspender assembleia que discutiu a privatização da Eletrosul, controlada pela Eletrobras, que é listada em bolsa de valores.
A ação foi movida por investidores minoritários da companhia, que têm 0,02% dos papéis da companhia – os outros 99,98% pertencem à Eletrobras. Os autores pediram a suspensão da assembleia alegando a reunião que aprovou a privatização ofendeu a suspensão da MP que permite a venda da Eletrobras à iniciativa privada – a medida já foi revertida por decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal.
“Sobre as alterações apontadas – perda de autonomia e limite para novos gastos – é possível afirmar que são medidas inseridas no bojo do processo de privatização, e que, frise-se, permanecem terminantemente vedadas por força de decisão liminar proferida pela Justiça Federal de Pernambuco e mantida pelo Presidente do Tribunal Regional Federal da 5ª Região no processo 0800152-09.2018.4.05.0000”, afirmaram.
O problema nas mudanças, segundo os investidores minoritários, é que a empresa deixará de ser subsidiária da Eletrobras, tornando-se “uma espécie de filial não formalizada […] sem personalidade jurídica própria”. Essa mudança, para os autores, fará com que decisões fiquem inteiramente nas mãos da controladora, “reduzindo a empresa a mera extensão da organização principal”.
Eles também afirmaram que a assembleia não foi devidamente convocada, pois os documentos relacionados à matéria discutida não foram enviados a eles ou à CVM. A maneira com que o encontro foi organizado, disseram, caracterizou descumpriu o prazo de antecedência mínimo de 15 a 8 dias contados da publicação da primeira e da segunda convocação. “Ademais, não foi realizada a publicação do Edital em jornais de grande circulação conforme determina o procedimento o Manual elaborado pela própria Eletrobras, que, diante da inexistência de regulamentação do tema pela Eletrosul, deverá ser utilizado supletivamente”, complementaram.
Todos os argumento foram aceitos pelo magistrado. Bradbury explicou que todas as informações, por dever de transparência, deveriam ter sido enviadas por telegrama aos minoritários, além de ficarem à disposição na sede da companhia.
“Entendo que, no caso em questão, tal disponibilização na sede da empresa não seria suficiente, pois a abrangência do caso, que afetará não somente os acionistas, mas também os inúmeros trabalhadores da empresa, com repercussão inclusive nos cidadãos, que são os usuários do serviço da concessionária, aliado à importância da matéria a ser discutida na AGE, gera enorme clima de insegurança, mormente quanto às incertezas econômicas em que o Brasil vive neste momento, razão pela qual deve ser garantido a efetiva (e não somente a potencial) participação dos acionistas minoritários”, afirmou.
Ele ponderou que, apesar dessa exigência ser restrita a empresas de capital aberto, como a Eletrosul faz parte da holding da Eletrobras, que é listada em bolsa, a controladora é obrigada a encaminhar tais documentos à CVM “como forma de transparência e regularidade da convocação” da assembleia. “Não é possível que a administração colha dos procedimentos realizados apenas aquilo que lhe é favorável, enquanto descarte o que não lhe aprouver”, finalizou.
Para a advogada Maria Clara Araujo, da Advocacia Garcez, uma das profissionais que defende os minoritários na ação, a Eletrobras enviou uma proposta para a mudança de centenas de dispositivos dos Estatutos Sociais de suas subsidiárias, incluindo a Eletrosul.
“Sob o pretexto de ‘atualizações redacionais’, foram incluídas diversas modificações que, na prática, servem ao propósito de homogenizar as subsidiárias e prepará-las para sua venda. No entanto, não disponibilizou aos acionistas minoritários, e tampouco aos trabalhadores e sociedade em geral, alguns dos documentos mais importantes para o debate colocado em pauta”, explicou.
Para Maximiliano Nagl Garcez, também da Advocacia Garcez, a decisão demonstra que estavam corretas as entidades sindicais ao pleitear a anulação da Assembleia. “Não é admissível que um processo de tamanha envergadura, com potenciais efeitos devastadores para a sociedade, para as futuras gerações e para os trabalhadores, seja feito sem a transparência adequada”, diz.
Fonte: ConJur