Em julgamento recente, o Superior Tribunal de Justiça decidiu, por unanimidade, anular uma partilha realizada por meio de instrumento de doação que feria os limites da legítima, e contrariava a legislação sucessória.
O caso em questão teve origem em ação declaratória de nulidade de doação, na qual a recorrente contestava a partilha realizada por seus pais, visto que, enquanto ela recebeu R$39.000,00 (trinta e nome mil reais) em imóveis, seu irmão recebeu mais de R$ 700.000,00 (setecentos mil reais) em ações societárias.
A defesa do irmão fundamentou a suposta validade do instrumento alegando a existência de cláusula de mútua quitação e renúncia à ações futuras, o que, teoricamente, impediria que a Recorrente discutisse os termos da doação posteriormente.
A doação foi registrada por meio de escritura pública em 1999, o que motivou a análise do recurso sob a égide do Código Civil de 2016. Ocorre que, como bem fundamentado pela Relatora Ministra Nancy Andrighi, a nulidade absoluta do excesso de doação já era reconhecida pelo parágrafo único do art. 1.790 do CC/1916, que dispunha: “considera-se inoficiosa a parte da doação, ou do dote, que exceder a legítima e mais a metade disponível”.
A Relatora ainda destacou que “eventual afronta à legítima não é validada pelo consentimento dos signatários”. Assim, sendo a intangibilidade da legítima norma cogente, a cláusula de renúncia a eventual ação futura não possui o condão de convalidar doação inoficiosa, que é nula de pleno direito.
Nesse sentido, a Corte Superior reafirmou o entendimento do princípio da intangibilidade da legítima, o qual é expresso ao estabelecer que herdeiros necessários devem ser tratados de forma igualitária dentro dos limites da legítima.
O caso em tela chama atenção por possuir um recorte de gênero muito delimitado que não é raro no contexto das famílias tradicionais brasileiras, razão pela qual a posição do Superior Tribunal de Justiça é fundamental para reforçar que favoritismos parentais (de qualquer recorte) devem ser objeto da parte disponível do patrimônio e não mecanismo de violação do direito de outros herdeiros necessários.
A equipe Tavernard Advogados seguirá atenta aos entendimentos, formulações e interpretações da Corte para, assim, estabelecer as melhores e mais qualificadas estratégias para atender os interesses confiados ao time.