Administradores de Sociedades e o Dever de Diligência: Impactos da Decisão da CVM no PAS nº 19957.007916/2019-38

Previsto no artigo 153 da Lei nº 6.404/1976 e no artigo 1.011 do Código Civil, o dever de diligência é destacado entre um conjunto de deveres a serem observados pelos administradores de sociedades ao exercerem suas funções. O dever de diligência estabelece que o administrador deve agir com o mesmo zelo que um indivíduo ativo e probo empregaria na gestão de seus próprios negócios. Nesse sentido, espera-se que o administrador não apenas preserve o patrimônio, mas também busque sua multiplicação. 

Assim, os administradores devem adotar padrões elevados de diligência, o que envolve a qualificação para o cargo, boa administração, busca ativa de informações, investigação e monitoramento. Exige-se deles o emprego dos melhores esforços, sendo o dever de diligência uma obrigação de meio, mas não a garantia de um desfecho específico. 

A decisão da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) no Processo Administrativo Sancionador nº 19957.007916/2019-38 reabriu o debate sobre os contornos do dever de diligência ao analisar a responsabilidade de dois diretores da Vale S.A. pelo desastre de Brumadinho/MG, ocorrido em 2019. 

O Colegiado da CVM concluiu que o Diretor-Presidente da Vale S.A. não violou o dever de diligência, mas condenou o Diretor de Ferrosos ao pagamento de multa de R$ 27 milhões, por entender que sua atuação foi insuficiente para prevenir o desastre. O relator do caso, diretor Daniel Maeda, reafirmou que o dever de diligência não obriga o administrador a garantir “efetiva obtenção de resultados satisfatórios”. No entanto, sua análise destacou que as melhorias implementadas após o desastre de Mariana (2015) foram reativas e questionou se as medidas adotadas pelo Diretor de Ferrosos produziram efeitos concretos. Essa abordagem gerou preocupação quanto à possível relativização da obrigação de meio, podendo indicar uma aproximação com uma obrigação de resultado. 

A decisão da CVM levanta questionamentos sobre a extensão do dever de diligência e seus impactos na gestão empresarial. Se for consolidada uma interpretação que aproxima esse dever de uma obrigação de resultado, podem surgir reflexos negativos em razão da insegurança jurídica, como o desestímulo de profissionais qualificados a assumirem cargos de administração e a elevação dos custos dos seguros de responsabilidade (D&O). 

O caso segue como um marco para a discussão sobre a responsabilidade dos administradores e o equilíbrio entre a proteção dos acionistas e a segurança jurídica dos gestores. Diante da grande repercussão do tema, a consultoria jurídica empresarial para fortalecimento das práticas de governança corporativa se torna cada vez mais relevante. O cenário exige que executivos e gestores avaliem cuidadosamente sua responsabilidade, especialmente diante dos riscos inerentes à posição que ocupam, em busca de maior segurança jurídica no ambiente corporativo.